Hermes C. Fernandes
A igreja cristã se perdeu em meio a tantas estratégias e ‘moveres’. Um dos fatos que denunciam isso é a freqüente confusão entre testemunho e ostentação.
Os fiéis se inspiram em seus pastores que exibem suas aquisições materiais como um sinal da aprovação divina de seus ministérios. Ninguém ousa questionar. Se o pastor comprou um avião, é porque ele vive o que prega. Ora, se prega prosperidade, como poderia viver em dificuldade?
Esta é lógica perversa que acompanha tais movimentos.
Se um pastor fica doente, ninguém pode ficar sabendo. É segredo de estado. Porque se for ventilado entre os fiéis, sua fé será questionada, e seu ministério desacreditado. Haverá até quem suspeite de que ele esteja em pecado.
Se passar por um problema familiar, o caso é logo abafado. Se ele troca a esposa por uma mais jovem, isso pode indicar o cumprimento da promessa de Deus de que a glória da segunda casa será maior do que da primeira. O jargão “de glória em glória” é usado para justificar qualquer coisa. Trocou o carro por um mais novo. Trocou de esposa. Deixou a comunidade e foi morar numa cobertura de frente pra praia, e por aí vai. E ele conta de púlpito, sem o menor recato, como se fosse um testemunho.
Não sei como ainda não tiveram a idéia de lançarem uma CARAS GOSPEL (espero não estar dando idéia...rs). Líderes disputariam a tapa um espaço na revista para exibir seu luxo. E o que não faltaria é quem comprasse só pra xeretar e buscar inspiração.
Em vez de se inspirarem na vida de Cristo e de Seus apóstolos, os líderes atuais se inspiram nos executivos de empresas de marketing de rede, como Amway e Herbalife, onde a cada encontro, ouve-se testemunhos daqueles que se empenharam na divulgação dos seus produtos e na expansão de sua rede, e hoje exibem suas aquisições materiais como troféus e comprovação da veracidade da proposta da empresa.
- Estão vendo aqui o meu terno Armani? Jesus quem deu! Nem mesmo Salomão em toda a sua glória se vestiu tão bem. E Deus não tem filho predileto. Se deu pra mim, pode dar pra você. É só fazer a campanha certinho, dar o seu tudo, e depois será você que vai subir a este altar para testemunhar.
E o pior é que dá certo! Ninguém questiona de onde veio o dinheiro usado para comprar aqueles mimos exibidos pelo pastor. As pessoas ficam cegas por suas próprias cobiças.
O pastor deixa de ser mentor espiritual, para ser guru, coach, ou pelo menos, um exemplo de sucesso.
Aquele pastor que opta pela discrição, ou mesmo por uma vida mais recatada, logo é taxado de fracassado, medíocre, sem visão.
Quando reflito sobre isso, lembro de dois reis com posturas completamente diferentes.
O primeiro é Salomão, que ao ser visitado pela Rainha de Sabá, deixou-a boquiaberta, não pela suntuosidade do seu palácio, nem pelas jóias que usava, mas pela sabedoria de suas palavras, a excelência do serviço prestado por seus servos e a qualidade do culto oferecido a Deus. O texto diz que ela ficou como fora de si (2 Cr.9:1-4). A postura de Salomão e de seus servos era o seu cartão de visitas. Seu testemunho já alcançava os lugares mais longínquos da Terra, atraindo gente de todas as nações.
O segundo rei que vem à mente é Ezequias. Depois de ter sido curado por Deus, Ezequias recebeu a visita de uma comitiva da Babilônia. Amostrado que só ele, resolveu tirar uma onda com os mensageiros babilônios, e assim, mandar um recadinho para o seu rei.
- Vejam toda a casa do meu tesouro. Quanta prata, ouro, especiarias, ungüentos. Aproveitem para ver minha casa de armas. É tudo meu! O Senhor me deu! Relatem ao seu rei a grandiosidade do meu reino.
Assim que a comitiva se foi, Isaías, o profeta, veio a Ezequias e lhe perguntou: “Que disseram aqueles homens, e donde vieram a ti? Respondeu Ezequias: De um país muito distante vieram, de Babilônia. Perguntou o profeta: Que viram em tua casa? Respondeu Ezequias: Tudo o que há em minha casa viram. Coisa nenhuma há nos meus tesouros que eu não lhes mostrasse” (2 Reis 20:14-15).
Aquilo foi testemunho ou ostentação? Precisa responder?
Por causa de sua ostentação, Deus lhe mandou dizer que aqueles mesmos babilônios viriam no futuro, e tomariam todas aquelas riquezas, e ainda levariam seus descendentes para o cativeiro.
Isso é que dá ostentar. Deus não tem compromisso com a nossa vaidade.
Já participei de convenções de igrejas que eram verdadeiras feiras de vaidade. Alguns convencionais faziam questão de ficar nos melhores hotéis, pagar motoristas particulares, comer nos mais requintados restaurantes. E quando conversavam entre si, o assunto sempre girava em torno de números. Quantos membros, quantas congregações, quanto isso, quanto aquilo, etc. Ninguém queria ficar por baixo. Se o culto tivesse cem pessoas, dizia-se que tinha quinhentas. Se batizou dez, contava que havia batizado cinqüenta. Era o tal de comer sardinha e arrotar caviar.
Não estou dizendo que tais coisas sejam erradas por si mesmas. O problema está no espírito por trás de toda esta ostentação.
Se quisermos resgatar a credibilidade da igreja cristã, teremos que repensar nossos parâmetros, e trocar a ostentação pelo verdadeiro testemunho. As pessoas se sentirão atraídas, como aconteceu com a rainha de Sabá, que viajou milhares de quilômetros, só para conferir a sabedoria que Deus dera a Salomão.
A bem da verdade, a ostentação também atrai, só que outro tipo de público. Não os que querem ouvir a Palavra, mas os que querem se dar bem. Os mensageiros da Babilônia sempre voltam, porém com o intuito de saquear, de se apossar dos bens alheios, e depois, terem também o que contar. Com isso, a roda continua a girar, garantindo a manutenção de tais 'moveres'.
Fonte: Genizah
Fonte: Genizah
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